sábado, 2 de outubro de 2010

O Festival e eu (III)

Uma coisa que descobri depois da minha última orgia cinematográfica neste Festival foi que três filmes ou mais no mesmo dia, para mim, simplesmente não dá. Fico admirado de ver pessoas que tiram o dia para verem filmes. Verdadeiros maratonistas. Eu, depois do terceiro filme, estava até meio desorientado, queria mesmo ir para minha casa e fazer qualquer outra coisa que não se assemelhasse a ver filme.
Entretanto, depois da overdose, veio a crise de abstinência. E ontem, parti para mais uma sessão dupla.
O primeiro filme foi MONSTROS (Monsters, Gareth Edwards, Reino Unido, 2010). Como vem sendo bastante recorrente neste Festival, o diretor do filme estava presente na sessão. Não sei se porque nos outros anos eu não fui tão assíduo quanto neste, ou se realmente desta vez a organização do evento se esmerou mais em trazer os realizadores, mas fato é que este já é o quarto filme que vejo, que conta com a presença de algum membro da produção. Acho isso bem bacana principalmente por dois motivos: o primeiro, mais genérico, pela visibilidade que confere ao Festival, cada vez mais sólido e tradicional; o segundo pela possibilidade de troca com os espectadores. Basta dizer que, sem este encontro, eu provavelmente não saberia que os únicos atores do filme eram os dois personagens principais e que os excelentes efeitos visuais não foram feitos por nenhum grande estúdio, mas, nas palavras da tradutora (não me recordo da expressão original em inglês usada pelo diretor), “feitos em casa”, o que, no decorrer da projeção, revelam-se informações impressionantes.
A premissa do filme é interessante. Após a descoberta de vida em um determinado planeta, a NASA envia uma sonda a fim de recolher amostras para pesquisa. Algo dá errado e, em seu retorno, a sonda cai em território mexicano. Os seres alienígenas, então, proliferam-se na região, que passa a se chamar Zona Infectada e esta passa a contar com um forte aparato de segurança, principalmente por ser exatamente a zona de fronteira com os EUA. Andrew Kaulder (Scoot McNairy), um jornalista fotográfico, é enviado para uma região próxima para resgatar Sam (Whitney Albe), a filha do dono da revista para a qual trabalha.
Logo nos eletrizantes minutos iniciais vemos um comboio do exército americano (com um soldado entoando “Cavalgada das Valquírias”, evocando o clássico personagem de Robert Duvall em “Apocalypse Now”) seguindo pela Zona Infectada e sendo atacado por uma das gigantescas criaturas. Era, principalmente, os home made (será que foi essa expressão?) efeitos visuais dizendo ao que vieram. Daí em diante, o filme passa a apresentar os personagens e a trama. Tanto McNairy quanto Albe estão excelentes, ele no papel do jornalista fotográfico fanfarrão e sedutor, e ela no de filha de pai rico insatisfeita com os rumos de sua vida. Como dito, a missão dele é levá-la em segurança de volta aos Estados Unidos, só que como todo bom fotojornalista que vive na pindaíba, ele decide também aproveitar a oportunidade para ver se consegue fazer seu pé de meia com algumas imagens das tragédias (como ele diz em dado momento, imagens de crianças mortas valem alguns milhares de dólares e de crianças felizes não valem nada). Alguns imprevistos acontecem e a única maneira deles chegarem aos EUA é atravessando a Zona Infectada por terra.
Um dos grandes problemas do filme é não saber exatamente qual filão explorar, ou talvez querer conferir uma complexidade à situação, sem, entretanto, mostrar-se suficientemente maduro para tal. Quando mencionei que os primeiros minutos serviam principalmente para os efeitos visuais dizerem ao que vieram, foi porque o tipo de filme que insinuam é completamente diferente do que se vê em seguida. Não é propriamente um filme de ação, a metáfora zona de fronteira/zona infectada parece não evoluir deste trocadilho e a alternativa “filme de ET”, aventada quando das primeiras aparições dos bicharocos, é abandonada logo em seguida, restando apenas a possibilidade de que desde o início a idéia era a de um filme sobre romance em situações adversas. Ficamos sem saber também o que diabos Sam fazia naquele lugar, por que seu pai milionário não mandou um jatinho fretado para buscá-la, por que não recorreram à Embaixada quando do sumiço de um dos passaportes, tendo em vista que a situação fora da zona infectada parecia razoavelmente controlada e ainda, para quê tanta atenção a uma atadura no braço de um dos personagens se, ao final, a lesão (cuja origem também não é explicada) mostra-se irrelevante para a história.
Mesmo assim, o filme possui alguns méritos. Além da boa atuação dos únicos atores, já mencionada, e dos efeitos especiais, o filme consegue entreter criando uma boa atmosfera de tensão e também graças à boa química do casal principal.
O filme seguinte foi LA CASA MUDA (La casa muda, Gustavo Hernández, Uruguai, 2010). Descobri-o meio que por acaso na internet há uns meses e fiquei acompanhando para saber se iria estrear em algum momento. Ficou famoso não só por ter custado somente 6.000 dólares mas também por ser todo filmado com uma câmera fotográfica comum em forma de plano-seqüência (sem cortes). Segundo li na internet, a história é inspirada em um crime bárbaro ocorrido na década de 40 em que dois corpos foram encontrados mutilados em uma casa em um local isolado no Uruguai sem que se tivesse qualquer pista do assassino e muito menos das motivações.
O filme, então, acompanha, em tempo real, o terror vivido por Laura e seu pai Wilson ao descobrirem que não estão sozinhos na casa abandonada (e isolada) que foram encarregados de reformar.
Explorando habilmente a máxima dos filmes do gênero de que o que realmente assusta é aquilo que não é mostrado, o filme é extremamente eficiente ao construir uma atmosfera de absoluto terror. A casa abandonada em questão além de aparentemente não ser aberta há, pelo menos, uns cem anos, devido ao seu mobiliário antigo e estado precário de conservação (leia-se produção de arte indefectível), não conta com energia elétrica, o que obriga toda a ação a se passar em uma escuridão parcamente iluminada por lanternas e velas trazidas pelos personagens.
O filme caminha bem até um pouco antes do final, quando os mistérios começam a ser revelados. Se nos primeiros momentos, a idéia era a de uma concepção realista dos acontecimentos, aos poucos isto vai sendo abandonado, o que levou a platéia da sessão em que eu estava aos risos em algumas sequencias envolvendo uma boneca e outras envolvendo uma máquina Polaroid (justiça seja feita, uma das cenas mais aterradoras da projeção tem justamente a ver com a Polaroid, num contexto que me lembrou um pouco, mutatis mutandis, esta cena de O SILÊNCIO DOS INOCENTES).
O opção pela câmera fotográfica, além de representar talvez o principal motivo do baixo custo da produção, favoreceu-a justamente devido aos seus limitados recursos que somente possibilitam um enquadramento menos abrangente. Isto, além de conferir um clima claustrofóbico, realça, como dito, o lado misterioso da escuridão, uma vez que nos leva a pensar nos perigos que estão fora de quadro. Quando fiquei sabendo desta proposta, imaginei que a câmera seria subjetiva, à la A BRUXA DE BLAIR, mas não era, salvo nos minutos finais, cuja transição é bastante hábil e sutil.
Por fim, a idéia de fazer todo o filme em um plano-sequência, revela-se desnecessária (para não dizer puro exibicionismo, tendo em vista as inúmeras dificuldade que este recurso enfrenta), uma vez que para sentir-se terror em tempo real a presença, ou não, de cortes é irrelevante. Ainda assim, é um filme recomendável.

4 comentários:

  1. Puxa, adorei suas críticas. Principalmente os comparativos, dando links no youtube.
    Vc deveria investir nessa de crítico de filme :)
    Gostei de ambos os filmes e, mesmo com seus defeitinhos (rs), valem a pena mesmo.

    Qto a maratona.. bom, eu me amarro. Se me deixar, fico realmente o dia todo vendo filme ou episódios de seriados, hehe.

    Parabéns.
    Bjs
    Claudia Sardinha

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  2. Dessa lista vi "La casa muda". Pelas informações anteriores também me pareceu uma boa escolha. Mas, francamente, queria poder contar aqui spoilers para que você não gastasse nem seu dinheiro, nem seu tempo assistindo a esse filme (exceto, talvez, se pela companhia valer a bela furada). Entretanto, com spoilers, acho que meu comentário seria "moderado" (ou seja, não seria publicado).
    Por isso, vou me limitar a dizer que o filme é MUITO (!!) estimulante e intrigante. Fica-se o tempo inteiro a conjecturar por possíveis desfechos para o desenrolar da trama que pudesse explicar um grande conjunto de elementos aparentemente soltos. E se você estava mesmo gostando da brincadeira, então termine sua pipoca (vc pode acabar se esquecendo dela), pegue suas coisinhas e saia da sala faltando não mais de 10min para o fim. Pois se você é uma pessoa sensata, que torce pelo filme, então nunca nenhum dos seus possíveis finais estará certo. Sem mais.

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  3. Olha a refilmagem aí! http://www.bloody-disgusting.com/news/22279

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  4. Why, god, why??? O pior é escalarem uma das gêmeas Olsen para o papel principal.rsrs

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