segunda-feira, 11 de outubro de 2010

Festival do Rio - The end

Ao todo, assisti 14 filmes neste festival. Para quem, nos outros anos, quatro filmes era um recorde, até que este foi um desempenho admirável. Portanto, depois da última sessão dupla aqui relatada ainda assisti mais cinco filmes, que passarei, brevemente (juro), a comentar.

A REGATA (La Régate, Bernard Bellefroid, França/Bélgica/Luxemburgo, 2009)
Grata surpresa. A idéia era tentar assistir O ÚLTIMO SONHO DE PINA BAUSCH no Estação Ipanema numa sessão de horário próximo. Lá chegando, descobri que tal sessão era mais disputada do que eu supunha e estava lotada. Peguei a programação e fui olhar as sinopses dos filmes que estavam por começar e, de todos, este A REGATA me pareceu a melhor opção.
Narra a história de Alex (Joffrey Verbruggen), um rapaz de 15 anos, apaixonado por remo, esporte no qual se destaca, e que tem uma relação pra lá conturbada com o pai Thierry (Thierry Hancisse). Filmes de relação pai e filho tem o condão de me emocionar com muito pouco. Por mais que a minha relação com meu pai fosse diametralmente oposta à mostrada no filme, de alguma forma, reconheci muitos elementos dela ali. Talvez porque certas coisas de afetos e traumas sejam mesmo universais, em maior ou menor grau, mas eu divago.
O filme retrata uma relação doentia entre pai e filho. O pai é o sujeito fracassado que, com inveja da juventude e do sucesso do filho no remo, faz de tudo para sabotá-lo para, depois, secretamente, morrer de remorso. O filho é o menino que percebe o comportamento do pai, até se rebela contra ele, mas não consegue deixá-lo para não se sentir culpado. Tudo isso retratado de maneira muito sensível, com uma câmera privilegiando o excepcional desempenho dos atores e num ritmo que acentua a melancolia e a revolta de Alex. Verbruggen e Hancisse conferem a seus personagens uma credibilidade imensa seja nos momentos de embates (muitas vezes físico mesmo), seja nos momentos em que ensaiam algum afeto. É extremamente comovente uma cena em que Alex, tão desacostumado a demonstrações de carinho, ganha um presente singelo de seus amigos e se emociona de forma que deixa os mesmos surpresos pela desproporção da reação.

STONES IN EXILE (Stones in exile, Stephen Kijak, Reino Unido, 2010)
O filme retorna a 1972, quando os Rolling Stones, fugindo da excessiva carga tributária do Reino Unido, mudaram-se para o sul da França. Na verdade, a lendária mansão que abrigou a banda era só de Keith Richards, mas, pouco a pouco, todos foram mudando para lá para darem início à gravação do álbum “Exile on Main St.”, um dos mais aclamados da música mundial.
O filme é bacana, principalmente para os fãs da banda, por todo material de arquivo que apresenta. Em vez de mostrar os participantes dando seus depoimentos, como tradicionalmente se faz nos documentários, optou-se por ilustrá-los com fotografias da época, o que é uma solução interessante para a imersão na atmosfera de sexo, drogas e muito rock n´ roll que aquela temporada francesa foi.
Certamente os mais fãs da banda (o que não é o meu caso, mas por puro desconhecimento, visto que após vê-lo, entendi porque os caras são tidos como monstros sagrados do rock) sabem a preciosidade inestimável que é este filme, o que me dispensa recomendá-los. Desta forma fica a recomendação para aqueles que, como eu, não são tão profundos conhecedores da banda, para que entendam um pouquinho não só sobre a mesma, mas sobre uma época tão efervescente culturalmente quanto os anos 60/70.

A SOLIDÃO DOS NÚMEROS PRIMOS (La Solitudine Dei Numeri Primi, Saverio Constanzo, Itália, 2010)
Baseado no romance homônimo de Paulo Giordano (também responsável pelo roteiro junto ao diretor, Saverio Constanzo), esse filme narra a história de Mattia e Alice, personagens que, desde crianças, lidam com traumas que os tornam cada vez mais isolados da sociedade e cujas vidas inevitavelmente se cruzam em épocas diferentes. Apoiando-se numa idéia de sincronicidade, a história é dividida, basicamente, em três épocas distintas: Infância, adolescência e juventude dos personagens, se comunicando não somente quanto aos infortúnios acontecidos em cada época como também criando padrões que se repetem em diferentes épocas. Aos poucos vamos descobrindo as dores e os traumas de cada um e a razão da ligação tão forte que os une, tudo conduzido de uma maneira muito envolvente e terna. Sem dúvida, em termos de cinema, este foi dos melhores que vi no Festival.

29 PALMS (Twentynine Palms, Bruno Dumont, França/Alemanha, 2010)
Eu tinha a idéia de tentar ver pelo menos um filme das mostras específicas do Festival (A humanidade de acordo com Bruno Dumont, Essencial Skolimowski e Foco Argentina). Só não consegui ver um do Skolimowski. Confesso que esperava mais de um filme do Bruno Dumont. Nunca havia ouvido falar nele até este Festival e, quando fui procurar, li boas recomendações de fontes confiáveis. O que ficou deste filme, para mim, foi, ok, uma grande competência para o uso da câmera (o cara, obviamente, sabe filmar – sim, existem auto-proclamandos cineastas que não sabem) e um ensaio sobre uma variante do conceito de risco e sobre a aleatoriedade da violência humana.

O ÚLTIMO SONHO DE PINA BAUSCH
(Tanzträume – Judgendliche Tanzen “Kontakthof” von Pina Bausch, Anne Linsel, Rainer Hoffman, Alemanha, 2009)
A primeira vez que dança fez sentido para mim, enquanto arte, foi justamente com um trecho de uma peça de Pina Bausch, consagrada dançarina e coreógrafa alemã, que o Almodóvar escolheu para abrir FALE COM ELA. Era um trecho de Café Muller, uma das peças mais famosas de Bausch. Até então, eu via dança apenas como mero espetáculo visual, sem muito envolvimento emocional. Depois de Café Muller, isto mudou.
Neste documentário é mostrado todo o trabalho de montagem de uma de suas peças com adolescentes que nunca haviam tido qualquer experiência com dança, no que provavelmente foi um de seus últimos trabalhos, visto que, infelizmente, ela faleceu em meados do ano passado. É muito bacana ver toda a evolução do grupo, o crescente envolvimento afetivo-emocional deles entre si e com o trabalho e, principalmente ter um pouco mais de contato com essa personalidade ainda tão pouco conhecida por mim (só a tinha visto dançando, mas nunca falando, interagindo com as pessoas – por mais que ela apareça tão pouco é inegável que suas aparições são, graças ao seu carisma, alguns dos pontos altos do filme). Fechou o Festival com chave de ouro.

Um comentário:

  1. Dessa lista, vi apenas "O último sonho de Pina Bausch".
    E sim, quando Pina (como lhe chamavam) aparece em cena, surgem também alguns dos melhores momentos do documentário. É como se toda a preparação que existiu durante meses fosse fazer sentido quando aquela mulher (quase mítica, a principio) os visitasse.
    Mas são tantos os bons momentos capturados por aquela câmera indiscreta que seguia os ensaios do grupo, que tenho sinceras dificuldades em rotular melhores momentos. Por isso, cito a mensagem que permeia todo o filme como o melhor que ele trás: uma brincadeira de se superar; que arranca justos aplausos da platéia, dentro e fora das cenas.

    ResponderExcluir