Inspirada na mais popular biografia do internacionalmente conhecido médium mineiro - “As vidas de Chico Xavier”, de Marcel Souto Maior - a adaptação cinematográfica é bastante fiel aos episódios lá narrados. Sua infância difícil em Pedro Leopoldo, os conflitos que seu “dom” geravam a sua volta, sua extrema bondade e beneficência para com os mais necessitados. Está tudo lá. O que há de novidade, sem dúvida, está na possibilidade de humanizá-lo, torná-lo mais uma vez próximo, quase palpável (sendo certo que tal iniciativa paradoxalmente pode exalçá-lo a uma categoria cada vez mais mítica, mas eu divago). Quem, como eu, não o conheceu pessoalmente, após ver o filme, se sente um pouco próximo dele, ao mesmo tempo em que reconhece que havia algo de extraordinário sobre ele.
Sua personalidade simples, seu bom humor, sua doçura, sua mineirice irresistível e sua mediunidade intrigante foram brilhantemente captadas e expressadas por seus intérpretes. O menino Matheus Costa, e os atores Ângelo Antônio e Nélson Xavier compõem um naipe de “Chicos” extremamente cativante, praticamente impossível de não simpatizar. Aliás, de maneira geral, a escolha do elenco foi bem feliz. Giulia Gam está perfeita na pele da desequilibrada madrinha Rita, inspirando ao mesmo tempo compaixão e desprezo, Letícia Sabatella mais fofa do que nunca no, digamos, “perispírito” de Maria João de Deus e Tony Ramos e Christiane Torloni absolutamente convincentes como pais do filho morto que enviou notícias através do Chico, ele cético, ela crente. Isso sem mencionar Luís Mello, Rosi Campos e outras participações muito bem vindas, como Aílton Graça e Ana Rosa. Creio que a única atuação destoante seja a de André Dias como Emmanuel, o mentor espiritual de Chico. Aquele que é sempre retratado como um protótipo de austeridade por ter sido um senador romano, ganhou ares debochados e um tanto afetados, que lhe retiraram um pouco da credibilidade, funcionando melhor nos momentos cômicos do que nos de maior seriedade. Basta comparar a cena que envolve a questão do uso da peruca com a que envolve um problema nos olhos do médium. Outra questão que me incomodou foi o uso excessivo de trilha sonora para as passagens envolvendo mediunidade, remetendo a um clima sobrenatural que não combina com a naturalidade com que Chico convivia com o fenômeno, mas reconheço que tal assunto ainda é visto por muitos como um tabu. De qualquer forma, não chega também a ser nada tão exagerado assim. Talvez eu que seja exigente demais.
Como muitos devem ter percebido, sou espírita. Chico faz parte do meu imaginário desde sempre. Fico feliz em ver suas histórias no cinema e, para mim, é praticamente impossível dissociá-lo da doutrina que abraçou e pela qual trabalhou até sua morte, aos 92 anos, deixando um legado inestimável de exemplos e obras psicografadas de temática evangélica-espírita extremamente profundas, mas entendo que este não seja um “filme espírita”. A um dado momento, Chico, no pinga fogo, menciona princípios da evolução anímica. Foi surreal ver este tema abordado fora do centro espírita, em uma sala de cinema. Acho bastante oportuna a divulgação, mas não é um filme cujo foco principal é divulgar a Doutrina Espírita, muito embora isto ocorra reflexamente.
Aliás, creio que uma das grandes virtudes do filme é prender-se à figura do Chico e não à Doutrina Espírita. Não que a Doutrina não seja importante, pelo contrário, mas esta está fabulosamente divulgada na Codificação organizada por Allan Kardec para quem quiser estudá-la. A questão é que, mais importante do que pertencer a este ou aquele seguimento religioso, Chico Xavier foi e sempre será um homem de bem. E sempre é relevante se falar de homens de bem.
Impecável como sempre, chu.
ResponderExcluirE claro, eu e você, compartilhamos das mesmas opiniões a respeito. Mas cofnesso que ja me acostumei com aquele Emmanuel.