Alguns comentários sobre os filmes que já vi neste festival. E vocês? O que têm visto? O que tem achado?
TODAS AS MÃES e A GENTE ACABA SE ACOSTUMANDO
Foram os primeiros filmes que vi no Festival, por sugestão do Rodrigo. A idéia era assistir somente “A gente acaba se acostumando”, mas chegando ao cinema, fomos surpreendidos pela informação de que seria uma sessão dupla. Ambos são documentários e parecem muito mais um especial para a televisão do que propriamente uma obra cinematográfica. O primeiro filme é sobre as mulheres sobreviventes do genocídio perpetrado contra a população curda no Iraque, pelo Sadam. Acompanha a rotina dessas mulheres, seu luto contundente e a esperança de, um dia, reencontrarem seus filhos e maridos desaparecidos já há pouco mais de 20 anos, mesmo depois da descoberta de inúmeros corpos em uma vala comum.
O segundo é sobre meninas iranianas vítimas de violência familiar, que vivem em um abrigo. Carência, ebulição hormonal, cultura de costumes rígidos, compõem ainda este mosaico contextual. Há a menina que tenta seduzir o entrevistador, a com tendências suicidas, a com síndromes mentais e a que narra as experiências mais escabrosas que viveu com o tom de voz de quem conta história de ninar. O filme é bacana mais pelo painel humano que exibe do que por seus méritos enquanto documentário.
NOSSA VIDA EXPOSTA
O primeiro filme realmente bacana que assisti, também um documentário. Aproveita a história de Josh Harris, um pioneiro na internet, para propor uma reflexão sobre a maneira como a sociedade humana vem se relacionando após o impacto da web em seus costumes.
A sessão teve a presença da diretora Ondi Timoner e ela contou que conheceu Josh quando ele a convidou para participar de um de seus projetos (chamado por ele de ‘experimento’) mais ambiciosos, chamado “Quiet! We live in public”. O projeto consistia em juntar pessoas em uma casa em Nova York (que, na verdade, era uma espécie de bunker) onde estariam constantemente vigiadas por câmeras. A idéia era que as pessoas não precisassem sair de lá para nada. Josh, à época um milionário da turma dos “pontocom”, bancaria hospedagem, alimentação e lazer para todo mundo em troca de (suas almas?) suas privacidades (quiçá sanidades). Ondi, que já havia trabalhado com Josh em seu projeto pioneiro de TV online (muito antes de youtube e afins), foi então chamada para fazer o registro da experiência. Ela conta que, ao final, o material que reuniu não pareceu consistente o suficiente para fazer um filme e acabou arquivando-o. Eis que um dia, percebendo o crescimento de facebooks, youtubes e outras mídias sociais virtuais, ela se deu conta do quanto Josh havia sido visionário. Ele sempre dizia que, com o avanço da internet, haveria não só uma imensa perda de privacidade, como as pessoas demandariam por isso em busca de reconhecimento, ou de meros de 15 minutos de fama. Desta forma, Ondi percebeu que aquele ‘experimento’ nada mais era do que uma espécie de reprodução física dos ambientes virtuais nos quais as pessoas tem se relacionado hoje em dia, expondo suas vidas, suas opiniões e sua privacidade por livre e espontânea vontade. Aproveitando esse gancho, decidiu reunir o material que já tinha, acrescentar mais algumas pesquisas e entrevistas e fazer o filme. Ah, sim, o filme faturou um prêmio de melhor documentário em Sundance, em 2009.
CÚMPLICES DO SILÊNCIO
Primeira ficção que assisti. A sessão também contou com a presença de um membro da equipe, o produtor e roteirista do filme, Rocco Oppedisanno. Trata-se de uma produção ítalo-argentina sobre os anos de ditadura militar naquele país. Com ares auto-biográficos, o filme narra a história de um jornalista italiano que vai para a Argentina a fim de cobrir o mundial de futebol de 1978 e, ao auxiliar a esposa de um amigo (e se envolver com a mesma), percebe a hediondez do regime vivido no país.
O contraponto do absurdo do regime ditatorial com a alegria popular proporcionada pela Copa (e a utilização desta alegria para acobertar o tal absurdo) faz deste filme uma espécie de irmão siamês do nosso “Pra frente Brasil”.
O filme começa soando um tanto canastrão com tomadas um pouco ingênuas demais, que aparentemente não confiam tanto na inteligência do espectador, mas tem momentos de profunda emoção como aquele em que um militar procura um familiar numa montanha de cadáveres. E ainda, ao preferir não mostrar mais explicitamente as cenas de tortura, fixando-se mais nos gritos de pavor e dor das vítimas e no terror psicológico perpetrado pelos terroristas de Estado, conseguiu-se, ao contrário do que possa parecer, transmitir de maneira bastante pungente todo desespero e revolta que deviam sentir as mesmas nas mãos das celeradas máquinas de torturar e matar, que eram alguns dos militares daquele período.
POLANSKI: PROCURADO E DESEJADO
O primeiro da listinha abaixo que assisti. Meu interesse por este filme se deu por conta deste texto do Pablo Villaça que não só recomendo como me serve de motivo para escusar-me ao trabalho de tecer maiores comentários sobre a produção, devido ao fato de as mais importantes informações sobre a mesma estarem lá. Só gostaria de reforçar a qualidade do documentário que, além de mostrar todo o problema judicial que o diretor enfrentou, ainda nos oferece imagens raras de entrevistas e da vida do diretor, que se tornou uma personalidade ainda mais instigante para mim. Quanto a provocação do último post, creio que, se Polanski tinha algumas contas a acertar com a sociedade relativamente ao seu ato reprovável (mesmo que se argumente que em sua cultura era comum sexo entre um homem e uma menina menor de idade, ele estava no EUA, o que o obriga a observar suas leis), estas já estão mais do que acertadas, ao menos do ponto de vista moral, pois os motivos pelos quais o processo continua em aberto (o que lhe acarretou alguns dias de prisão domiciliar na Suíça recentemente) exorbitam, infelizmente, a esfera judicial justa. Desta forma, obviamente, isto nada tem a ver com sua inegável criatividade artística. Eu sei que não precisava, mas eu só queria pontuar.
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Foi sugestão minha o "A GENTE ACABA SE ACOSTUMANDO", mas eu mesmo não gostei.
ResponderExcluirOcorre que ele foi o segundo da sessão dupla, e depois de ver mães e filhas chorarem a dor pela morte de mais de 20 parentes, no que foi uma catástrofe humanitária, fiquei com pouca paciência de ver meninas querendo se matar porque terminaram com o namorado. Francamente, quis sair no meio.
Mas, vá lá, talvez se a sessão não fosse dupla, eu tivesse mais interesse.