domingo, 8 de agosto de 2010

Como ser eterno, em três acordes

Eu quero ter 90 anos para não ter medo de morrer. Eu quero que àquela altura a vida seja tão bela, que eu ache que já tenha visto tudo, e tão banal, que não me faça mais falta, de modo que morrer não me traga nenhuma revolta. Eu quero que neste dia não faça diferença se há vida após a vida, eu quero morrer como um senhor de pijamas que deixa seus chinelos tranqüilos ao pé da cama e deita, para dormir o sono dos justos. Eu quero ter conhecido tudo o que me foi dado conhecer, dos segredos deste mundo e de outros, de forma que eu não sinta mais fome e que meu andar seja digno e não temeroso. Eu quero poder falar do que eu sei e do que eu não sei sem reservas para ajudar os mais jovens e tolos, apenas com base na minha intuição afiada, como os velhos anciões de aldeia. Eu quero olhar minhas mãos enrugadas e nelas ver as mãos dos meus avós e me sentir orgulhoso de ter trabalhado, escrito cartas, ninado crianças, sentido o vento das estradas. Eu quero olhar as novas gerações e me ver nelas e quero ver estas gerações grávidas e parturientes de outras e certamente iria gostar imensamente se elas desejassem igualmente, um dia, chegar aos 90 anos.
***
Este texto me veio à cabeça hoje, vendo o meu avô. Feliz dias dos pais a todos os avôs, que fazem as vezes de pai.

Um comentário:

  1. "Era enfim a vida real, com meu coração a salvo,
    e condenado a morrer de bom amor na agonia feliz
    de qualquer dia depois dos meus cem anos"
    Gabriel García Marquez (sua versão colombiana)

    ResponderExcluir