domingo, 17 de julho de 2011

Aula de poesia (e semiótica) com tio Drummond


PROCURA DA POESIA

Não faças versos sobre acontecimentos.
Não há criação nem morte perante a poesia.
Diante dela, a vida é um sol estático,
não aquece nem ilumina.
As afinidades, os aniversários, os incidentes pessoais não contam.
Não faças poesia com o corpo,
esse excelente, completo e confortável corpo, tão infenso à efusão lírica.

Tua gota de bile, tua careta de gozo ou dor no escuro
são indiferentes.
Não me reveles teus sentimentos,
que se prevalecem de equívoco e tentam a longa viagem.
O que pensas e sentes, isso ainda não é poesia.

Não cantes tua cidade, deixa-a em paz.
O canto não é o movimento das máquinas nem o segredo das casas.
Não é música ouvida de passagem, rumor do mar nas ruas junto à linha de espuma.

O canto não é a natureza
nem os homens em sociedade.
Para ele, chuva e noite, fadiga e esperança nada significam.
A poesia (não tires poesia das coisas)
elide sujeito e objeto.

Não dramatizes, não invoques,
não indagues. Não percas tempo em mentir.
Não te aborreças.
Teu iate de marfim, teu sapato de diamante,
vossas mazurcas e abusões, vossos esqueletos de família
desaparecem na curva do tempo, é algo imprestável.

Não recomponhas
tua sepultada e merencória infância.
Não osciles entre o espelho e a
memória em dissipação.
Que se dissipou, não era poesia.
Que se partiu, cristal não era.

Penetra surdamente no reino das palavras.
Lá estão os poemas que esperam ser escritos.
Estão paralisados, mas não há desespero,
há calma e frescura na superfície intata.
Ei-los sós e mudos, em estado de dicionário.

Convive com teus poemas, antes de escrevê-los.
Tem paciência, se obscuros. Calma, se te provocam.
Espera que cada um se realize e consume
com seu poder de palavra
e seu poder de silêncio.
Não forces o poema a desprender-se do limbo.
Não colhas no chão o poema que se perdeu.
Não adules o poema. Aceita-o
como ele aceitará sua forma definitiva e concentrada
no espaço.

Chega mais perto e contempla as palavras.
Cada uma
tem mil faces secretas sob a face neutra
e te pergunta, sem interesse pela resposta,
pobre ou terrível que lhe deres:
Trouxeste a chave?

Repara:
ermas de melodia e conceito
elas se refugiaram na noite, as palavras.
Ainda úmidas e impregnadas de sono,
rolam num rio difícil e se transformam em desprezo.

C.D.A.

domingo, 3 de julho de 2011

Sobre religião, sectarismo e espiritualidade

621. Onde está escrita a  lei de Deus?
- Na consciência.
O Livro dos Espíritos

Li uma frase outro dia na internet, atribuída a um físico chamado Steven Weinberg que diz mais ou menos o seguinte: “Com ou sem religião, pessoas boas farão coisas boas e pessoas más farão coisas más, mas para uma pessoa boa fazer uma coisa má, é preciso religião”. Achei demasiado preconceituosa e reducionista (como toda declaração preconceituosa). O curioso é que a lógica simplória utilizada no primeiro trecho é solenemente ignorada no segundo somente a título de um ataque gratuito à religião. Pessoas boas não fazem coisas más com ou sem religião, ou eu perdi alguma coisa? Ora, se a pessoa dita boa fez algo mal é porque ela não é tão boa assim, certo? E ela é assim com ou sem religião, certo?

Não descarto a possibilidade de eu não ter alcançado alguma lógica refinada, sutil demais para o meu entendimento grosseiro, mas acho que tampouco estou errado nas minhas divagações.

Uma questão relevante que certamente está por trás desta frase é uma distinção que ouso fazer entre religião e sectarismo. Para tanto, tomarei a liberdade de me lançar a uma breve conceituação, mas que não destoa do senso comum, sendo antes dois aspectos facilmente perceptíveis de um mesmo fenômeno (a relação com o sagrado). Religião, penso, é o aspecto espiritual do ser humano que o aproxima de Deus, é uma experiência mística, individual, é o famoso “religar”; já o sectarismo está relacionado com aspectos culturais, com a objetivação deste sentimento íntimo nos variados grupos humanos, que origina o surgimento de diferentes seitas. Dito isto, entendo que quando se fala nos problemas causados pela religião no mundo, está-se falando do sectarismo. Sim, concordo que há problemas no sectarismo, e o principal deles está ligado justamente com o terreno pedregoso das verdades absolutas de que a religião se ocupa. Assim, um dos requisitos de legitimidade de qualquer seita é a pressuposição de que ela encerra todas as verdades absolutas do Universo. O problema, como é sabido, ocorre quando as verdades absolutas de uma chocam-se com as verdades absolutas de outras. Junte-se a isso, a atávica dificuldade do ser humano de conviver com o diferente, e pronto, está aceso o barril de pólvora.

Por isso, defendo que dificilmente uma pessoa dita boa, fará uma coisa má em nome da religião, pode até ser em nome de sua seita e dos ideais que ela proclama, mas dificilmente em nome da religião. Por mais que a pessoa alegue que foi Deus que a fez delinqüir, resisto a acreditar que haja aí um fenômeno místico, mas certamente psiquiátrico (sem qualquer tom pejorativo, por favor). Obviamente que por trás desta conceituação minha há toda uma concepção de Deus plenamente identificado com ideais de amor, nos moldes do que se diz que pregou Jesus Cristo, o que não me parece uma forma tão disparatada de se conceber Deus. A relação com o sagrado, segundo meu ponto de vista não é vedada sequer para os ateus ou materialistas. Conheço inúmeros bastante mais “religiosos” que muito sectário por aí.

Para finalizar, copio e colo um texto que me chegou por e-mail de que eu gostei muito. A autoria é desconhecida. O que eu chamo de sectarismo, ele chama de religião e o que eu chamo de religião, ele chama de espiritualidade. Discordo de um ponto ou outro, mas é bastante inspirador:

As Diferenças entre Religião e Espiritualidade

A religião não é apenas uma, são centenas.
A espiritualidade é apenas uma.
A religião é para os que dormem.
A espiritualidade é para os que estão despertos.

A religião é para aqueles que necessitam que alguém lhes diga o que fazer e querem ser guiados.
A espiritualidade é para os que prestam atenção à sua Voz Interior.
A religião tem um conjunto de regras dogmáticas.
A espiritualidade te convida a raciocinar sobre tudo, a questionar tudo.

A religião ameaça e amedronta.
A espiritualidade lhe dá Paz Interior.
A religião fala de pecado e de culpa.
A espiritualidade lhe diz: "aprenda com o erro".

A religião reprime tudo, te faz falso.
A espiritualidade transcende tudo, te faz verdadeiro!
A religião não é Deus.
A espiritualidade é Tudo e, portanto é Deus.

A religião inventa.
A espiritualidade descobre.
A religião não indaga nem questiona.
A espiritualidade questiona tudo.

A religião é humana, é uma organização com regras.
A espiritualidade é Divina, sem regras.
A religião é causa de divisões.
A espiritualidade é causa de União.

A religião lhe busca para que acredite.
A espiritualidade você tem que buscá-la.
A religião segue os preceitos de um livro sagrado.
A espiritualidade busca o sagrado em todos os livros.

A religião se alimenta do medo.
A espiritualidade se alimenta na Confiança e na Fé.
A religião faz viver no pensamento.
A espiritualidade faz Viver na Consciência.

A religião se ocupa com fazer.
A espiritualidade se ocupa com Ser.
A religião alimenta o ego.
A espiritualide nos faz Transcender.

A religião nos faz renunciar ao mundo.
A espiritualidade nos faz viver em Deus, não renunciar a Ele.
A religião é adoração.
A espiritualidade é Meditação.

A religião sonha com a glória e com o paraíso.
A espiritualidade nos faz viver a glória e o paraíso aqui e agora.
A religião vive no passado e no futuro.
A espiritualidade vive no presente.

A religião enclausura nossa memória.
A espiritualidade liberta nossa Consciência.
A religião crê na vida eterna.
A espiritualidade nos faz consciente da vida eterna.

A religião promete para depois da morte.
A espiritualidade é encontrar Deus em Nosso Interior durante a vida. 

(AUTOR DESCONHECIDO)



Uma ótima semana a todos e muita paz!